quinta-feira, 1 de novembro de 2007

GOMES MONTEIRO, VULTO DAS LETRAS TRANSMONTANAS E NACIONAIS

por Paulo Sá Machado


Até há bem pouco tempo poucos se lembrariam de algumas obras escritas por Joaquim Gomes Monteiro, assim como do seu rico e interessante percurso de Jornalista. Escritor, Ensaísta e Director de Jornais e Revistas, algumas delas referências no panorama literário nacional.


Depois da reedição de "Feras no Povoado", um dos romances mais significativos de Joaquim Gomes Monteiro, edições Caixotim e incluído na prestigiada colecção "Caixotim Clássico", a edição também em Galego numa tradução de Concha Martinez, "Feras na Vila – Memorias dun Guerrilleiro", podemos dizer que Gomes Monteiro está junto aos Mestres da Literatura Portuguesa, lugar que há muito merecia ocupar.


A Câmara Municipal reconheceu o prestígio do Escritor e filho de Boticas, pelo que propôs ao Ministério da Educação que à Escola Básica dos 2º e 3º Ciclos de Boticas, fosse atribuído o nome de Gomes Monteiro, o que veio a acontecer por Despacho nº 12 980/2007 de 31 de Maio. Assim as Escolas de Boticas foram rebaptizadas como Agrupamento de Escolas Gomes Monteiro, Boticas.


Gomes Monteiro nasceu em Boticas a 5 de Junho de 1893, filho de Joaquim Maria Monteiro Chaves, também natural de Eiró, abastado comerciante e industrial, com negócios em Ramos, Rio de Janeiro, Brasil, onde esteve estabelecido durante quarenta anos, e de Mafalda Gomes de Vilarinho Seco, lugar das Alturas.


Cedo foi Gomes Monteiro para o Porto, onde frequentou o Liceu. Com 19 anos de idade inicia as suas lides jornalísticas. Em 1912 dirige "A Voz de Leça", para no ano seguinte, orientar e praticamente dirigir "Notícias de Cantanhede".


No Porto, vive na Casa Amarela, na Rua Oliveira Monteiro, que pertencia a seus familiares e onde foi acolhido, após a sua saída de Boticas. Em 1913-1914 colabora no Jornal "A Manhã"


Após o seu regresso a Lisboa, em 1915, depois de ter participado em Angola, nas campanhas do sul da Colónia, entrou para o Diário "A Situação", chegando a Chefe de Redacção. Seguidamente, transfere-se para a redacção do "Século"e passa para o "Diário de Notícias". Começa por ser redactor, sobe profissionalmente e estava no arquivo quando a morte o leva.


O ano de 1932 é o de maior criatividade de Gomes Monteiro, publica o seu primeiro livro de poesia "As Mulheres que amaram Jesus", com uma dedicatória "Às santas velhinhas da minha terra que embalaram a minha orfandade orgulhosa" e um importante depoimento-prefácio onde se identifica com as suas origens – Eiró - Boticas. Interessante verificar-se que Gomes Monteiro recorda com profunda saudade o seu Barroso, seu Eiró, a sua Boticas, sempre presente na sua obra.


Demonstra nesta obra a sua alma de poeta (que também o era), uma profunda tristeza por não ter sido acarinhado por seus pais, de quem sempre esperou uma palavra amiga, de um agasalho, de carinho.


Também publica "A Freira que morreu de amor (Soror Maria da Misericórdia)", "… pretendemos fazer a apresentação duma freira portuguesa que, apaixonada por certo capitão francês, se perdeu e morreu de amor. Todos irão supor – estamos mesmo a vê-lo – que se trará da famosa Soror Mariana Alcanforado, de saudosíssima memória … Pois não é assim".


Também em 1932, " faz sair, "Vieira de Castro e a sua tragédia", que dedica à Memória do "Zé Pires", modesto condenado a trabalhos forçados no Depósito Geral de Degredados de Luanda, um interessante livro camiliano, onde o romancista e Ana Plácido são protagonistas


No ano seguinte 1933, sai "A inocência de Urbino de Freitas", história romanceada do médico, Professor da Escola Médico Cirúrgica do Porto (mais tarde Faculdade de Medicina da U.P.) que foi acusado inocentemente (?) de ter envenenado os seus sobrinhos.


"A Dama do Seio Mutilado" dado à estampa em 1934 é uma obra baseada no percurso amoroso de um seu Amigo, onde este lhe conta a sua história de amor, com uma donzela russa, que o levou ao suicídio em Londres.


Em 1941 e numa edição de Romano Torres, surge o livro de Gomes Monteiro dedicado a "Bocage Esse Desconhecido", que é quase um repositório do percurso literário e poético de Bocage, para além de um retrato rectificativo do imaginário criado à volta do satírico, mordaz e inteligente poeta.


O "Anti-livro de S. Cipriano" mereceu na "Vida Mundial Ilustrada" de 16 de Abril de 1941 o seguinte referência: "Jornalista e escritor com uma obra sincera e fecunda como se impôs, há muito tempo, à consideração da crítica e à preferência do público. O ilustre romancista de "A Dama do Seio Mutilado", o historiador de "As Duas Catarinas da Rússia", o poeta de "As mulheres que amaram Jesus" e autor de tantas outras obras que, a seu tempo, mereceram os melhores louvores aos comentadores do panorama literário português, lançou agora um novo volume que, desde já se afirma como um extraordinário êxito de livraria – O Anti-livro de S. Cipriano" – obra cheia de curiosas revelações e de ensinamentos, mais uma notável contribuição para a sua brilhante carreira literária."


O livro "Vencidos da Vida" – Relance Literário e Político da Segunda Metade do Século XIX – surge em 1944, numa edição Romano Torres. Aparece a célebre foto de Eça de Queiroz, Oliveira Martins, Antero de Quental, Ramalho Ortigão e Guerra Junqueiro, e uma outra já com o grupo de os "Vencidos da Vida" completo, onde, para além dos referenciados, se podem ver: Conde de Ficalho, António Cândido, Conde de Sabugosa, Carlos Lima Mayer, Carlos Lobo de Ávila, Marquês de Soveral e Conde de Arnoso.


A sua obra mais emblemática, "Feras no Povoado", é um interessante e preciso relato da vida no Barroso, com especial incidência em Eiró – Boticas, editado em 1947, pela Empresa Nacional de Publicidade, este romance sobre Boticas e as suas gentes tem ilustrações de Stuart de Carvalhais representando a Vila, como era em 1940.


Dedica o romance à sua irmã que não chegou a conhecer.


A veneranda freguesia do Eiró, situada na falda meridional do Leiranco, continua a ser, com pequena diferença, o que era há duzentos anos. Hoje, quem trepar ao planalto barrosão, encontrara ainda a brenha selvagem dos tempos de Nuno Álvares, que segundo a tradição, ali teve senhorios…


Assim inicia Gomes Monteiro o seu romance, um defensor do "cabralismo" raro para a época, contra os miguelistas e a esquerda liberal.


Como curiosidade, refira-se que este ano (2007) se assinalam 60 anos da edição das "Feras no Povoado" de Gomes Monteiro.


É o seu romance mais conhecido e reconhecido. É um hino de saudade a Boticas, como se pode comprovar, bem como ao seu início de vida.


A Editorial Minerva publica em 1948 "O Drama de Gomes Leal" com inéditos do Poeta. É a resenha quase biográfica, a que Gomes Monteiro imprime um ritmo e uma escrita cheia de requinte literário, que faz com que o biografado realce sobremaneira. Um requinte de escrita.


Em 1950, publica o seu último romance "A Revisão do Processo de Jesus", que mereceu no Diário de Notícias a 26 de Março, a seguinte crítica:


Joaquim Gomes Monteiro usa o pseudónimo de "Sérgio de Montemor". Como Jornalista no Diário de Notícias chega a Chefe da Biblioteca do Arquivo do Diário de Notícias, onde morre ao serviço do Diário lisboeta.


Dirige também o Jornal "Sports" e a revista " Cine", tendo sido redactor e depois Director do "Arquivo Nacional", substituindo em 1939, o Director Rocha Martins, um franquista que é deputado monárquico em 1919.


Gomes Monteiro dispersa a sua extraordinária actividade por outros jornais e revistas, sendo redactor do "A B C" e da "Ilustração", dirigida por João de Sousa Fonseca e editada pela Livraria Bertrand.


Dedica-se a escrever sobre história, estudos histórico-literários, ensaios políticos, biografias, fazendo incursão pela poesia, etc, como atestam os inúmeros títulos publicados. Praticamente todos os livros são profusamente ilustrados, uma curiosidade para a época, neste género de trabalhos. É também tradutor consagrado, tendo traduzido obras de Alexandre Dumas, Victor Hugo, Ponson du Terrail, entre outros.


O escritor, ensaísta, historiador e jornalista morre a 8 de Dezembro de 1950, com 57 anos, na Freguesia de S. Sebastião da Pedreira, Lisboa.


Hoje podemos afirmar que Gomes Monteiro, para além de ter voltado ao escaparate das Letras Portuguesas, tem a admiração e respeito de todos nós.


2 comentários:

Luís disse...

Boa tarde,

Gostaria de obter informações sobre uma tradução feita por Gomes Monteiro de um livro de Ponson du Terrail cujo título em português foi "O Rei dos Ciganos" Podem ajudar-me? Obrigado.
Contacto
José Luís Veloso
jlveloso@yahoo.com

Cristiano Jesus disse...

Boa tarde,

É possível saber se Joaquim Gomes Monteiro teve filhos e se teve quem foram?

Recebi hoje o livro "Vencidos da Vida", edição de 44, que tem a seguinte informação na folha de rosto: «Oferecido pelo Pai, em 1948 // M. Fernanda Monteiro».

Gostava de saber se este exemplar que adquiri pertenceu a um dos seus filhos.

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