quinta-feira, 13 de novembro de 2008

As barragens transmontanas

É de todos bem conhecida a dependência energética do País.

Os que analisam na generalidade o assunto e aqueles que minimamente se interessam por esta questão sabem quão desejável é reduzir tal dependência dum modo saudável e sustentável, como agora é moda dizer, e nesse campo as energias renováveis lideram as alternativas.

Dentro destas, Portugal dispõe de vento, sol e água fluvial e marítima que é imprescindível explorar para podermos continuar a manter os padrões de qualidade de vida atingidos pela generalidade da população portuguesa.

No potencial hídrico, aquele que agora me interessa detalhar, é sabido estarmos a 50% do seu aproveitamento, sendo evidente a necessidade de captar a respectiva energia ainda disponível a qual, ainda por cima, proporciona o armazenamento de um bem que, no futuro, se adivinha escasso.

No nosso País 85% da energia tem origem em matérias fósseis, na sua maioria importadas, o que se traduz numa pesadíssima factura energética nacional. A redução da dependência do petróleo e a redução das emissões de gases de estufa obrigam à tomada de opções que valorizem a energia limpa e renovável.

O programa governamental de construção de barragens com elevado potencial hídrico prevê 10 novos empreendimentos os quais, a concretizarem-se até 2020, como planeado, conduzirão ao aproveitamento de 70% das nossas capacidades hídricas.

Não constando de tal Plano a Barragem do Baixo Sabor por já estar adjudicada, para a nossa Região estão antevistas as Barragens da Foz do Tua, Pedroselos, Alto Tâmega, Daivões e Gouvães, ou seja, uma contribuição significativa de Trás-os-Montes e Alto Douro (tal como no passado, quando da construção das barragens do Douro) para o desenvolvimento sustentável do todo nacional.

Vozes velhas (que se dizem novas), erguem-se contra este plano com argumentos diversos tentando impedir a sua implementação num coro de opiniões que passaremos a tentar dissecar servindo o que adiante se disser, de um modo geral, tanto para a Barragem do Baixo Sabor como para a Barragem da Foz do Tua.

1º As Barragens não devem ser construídas porque não são acautelados os interesses das populações.

Eu terei que perguntar forçosamente se acaso alguma aldeia ou lugar irão ficar submersos, se haverá proprietários de terrenos, no futuro submersos, que não serão indemnizados, se existirá algum atravessamento (ponte ou passagem) que ficará sem alternativa no futuro.

Discutirei, também, a questão da perda de rendimento das populações. Infelizmente são escassos os terrenos em exploração que irão ser afectados pelas albufeiras. É sabido que as encostas das nossas linhas de água há muito deixaram de ser fabricadas e os leitos em planícies agricultáveis são em área insignificante. Duvido, igualmente, que no âmbito do pacote indemnizatório não seja possível atribuir, durante o período de vida dos actuais proprietários residentes, um subsídio financeiro de acordo com a rentabilidade da actual exploração.

2º As barragens constituem um aleijão à Paisagem e á Biosfera.

No tocante às ofensas às paisagens, eu gostaria de perguntar aos que me lêem se, comparando as paisagens do Douro Nacional e do Douro Internacional, antes e depois da construção das barragens de Miranda, Bemposta, Picote, Pocinho, Valeira, Régua, Carrapatelo e Crestuma, se acham que tudo foi pervertido, que o que era antes tinha sido uma dádiva da Natureza que o homem imbecilmente destruiu?

Digam-me com franqueza se as não acham agora com uma beleza incomparavelmente acrescida e, mais do que isso, com capacidade para melhor serem usufruídas a partir dos barcos navegando nas albufeiras das ditas barragens.

Quanto ao impacte na Biosfera, digam-me em que é que um plano de água é mais agressivo para a atmosfera do que a chaminé de uma central termoeléctrica?

Aparecem agora, contudo, referências malévolas quanto à produção de metano a partir das albufeiras, assegurando que este gás é 21 vezes mais contributivo para o aquecimento global do que o dióxido de carbono. Meus caros ambientalistas: digam-me em que parte do globo é que fizeram tais estudos e analisem se no Sabor ou no Tua tal será possível, sabendo-se da capacidade regenerativa destes cursos de água com nascentes na cadeia montanhosa galaica sempre alimentada por forte pluviosidade.

3º A albufeira vai engolir milhões de plantas, de animais e a terra dos homens.

Observemos o caso do Sabor. Tirando o alagamento duma área por certo pouco maior do que o maior dos latifúndios alentejanos (ou será que fiz mal as contas?), não vejo qualquer óbice a que na restante área em encosta, afecta ao empreendimento, se continuem a desenvolver as espécies florestais nativas (cerejeiras, sobreiros, carrascos, buxo, etc.) ora em recrudescimento.

Também não vejo qualquer impedimento, derivado do alargamento e aprofundamento do curso de água, para o crescimento e reprodução das espécies animais ora existentes. Quero crer que em ambas as margens do Douro Internacional continuam a existir lobos, raposas, lebres, coelhos, javalis, corças, esquilos, etc. Poderão ser animais portugueses ou espanhóis mas também, no futuro, poderá haver lobos de Alfândega, lebres de Mogadouro e javalis de Moncorvo. E se acaso houver perigo na extinção de alguma espécie (lontras?) porque não obrigar a EDP a criar um centro de criação, reabilitação e de repovoamento de tal espécie?

4º Há outras alternativas mesmo na energia hídrica; em vez de grandes barragens devem ser construídas mini-hídricas.

Esta questão traz-me à memória o retardamento da construção da Barragem do Alqueva, onde idêntico argumento foi estudado até à exaustão durante mais de 40 anos, o que levou alguém mais expedito, frontal e já desesperado a pintar, no paredão de uma obra acessória daquele grande empreendimento: "CONSTRUAM-ME, P_ _ _ _"!

Infelizmente não tenho, de momento, dados técnicos que me autorizem a desmontar categoricamente este argumento mas o conhecimento que possuo acerca da mini-hídrica de Gimonde (Bragança) permitem-me extrapolar os dados de que disponho. A noção que tenho é que a energia ali produzida e vendida actualmente pela Autarquia à EDP, daria para o abastecimento de uma população de cerca de 2.000 habitantes. O problema é que seriam precisas mais de 50 mini-hídricas equivalentes para alcançar a energia que virá a ser disponibilizada pela futura Barragem do Baixo Sabor e não há espaço para implantar tanta mini-hídrica nos 120 Km do Sabor.

5º As barragens são muito dispendiosas e são desastrosas para o ambiente (pela erosão e perda de solos, retenção de sólidos finos, mau comportamento nos períodos de seca, etc.).

A relação custo/benefício dos empreendimentos hidroeléctricos é reconhecidamente uma das suas vantagens quando comparamos os diversos modelos produtores de energia. Ao inicial pesado investimento, desde logo com uma forte componente de mão-de-obra local e incorporação de materiais e equipamentos de origem nacional, segue-se um longo período de vida útil com despesas quase nulas de operação e manutenção.

Invocar erosão ou perda de solos no caso das barragens transmontanas parece querer trazer à baila problemas característicos de outras regiões, planas e aluvionares, que não são, de todo, os casos em apreço.

Chamar a atenção para a possível insuficiência na afluência de caudais é subestimar os estudos que forçosamente se levam a cabo na fase inicial de análise da viabilidade de qualquer investimento no domínio hídrico. É certo que em períodos de grande seca se reduz a produção deste tipo de energia, mas esta é mais uma razão para diversificar as fontes de energia e incluir nelas também a hídrica, sempre tão disponível, nessas alturas de crise, para ajudar a combater os incêndios florestais e para suprir as sedes de muitas bocas e de muitas terras aráveis.

Nem tudo são rosas e não há intervenção humana que, de uma forma ou de outra, não prejudique a Natureza. No caso que venho expressando em defesa da construção de muitas e disseminadas barragens pelo País fora, o caso da retenção de sólidos é um dos (poucos, na minha opinião) aspectos malévolos das barragens pois impede o seu deslocamento e deposição, contrariando o seu natural andamento. Mas também aqui, se houver uma gestão adequada da sua recuperação via dragagens, ou outra, se poderá economicamente contribuir para a valorização do curso de água com mais uma fonte de rendimento não despicienda.

Oxalá em próximos números do nosso jornal apareçam novos argumentos contra a construção das barragens transmontanas que aqui estarei para os voltar a atacar.

António Cepeda

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